Naquele dia, o Custódio deveria estar feliz. Afinal ia finalmente fazer o seu exame de português e tinha-lhe sido atribuída uma sala onde ele era o único rapaz, no meio de quinze belas jovens. No entanto, depois da chamada inicial, o Custódio verificou que ficaram vazias duas mesas. Pensou: "Oh, não, elas são treze, oh, que azar. A coisa assim não me vai correr nada bem." Ouviu atentamente as instruções do professor, preencheu os cabeçalhos da folha de prova e olhou repetidas vezes para o relógio, pensando se elas iriam chegar a tempo de mudar a sua sorte. O seu estado de ansiedade foi aumentando gradualmente. Mentalmente foi-se lembrando dos nomes de cada uma das raparigas para verificar quem tinha faltado.
Lembrava-se perfeitamente de que havia uma Carlota, três Carolinas, sete Catarinas e uma Cheila, antes do tão desejado nome da rapariga que ansiava conhecer. Cília, o Custódio nunca antes tinha conhecido uma Cília. Imaginava-a alta, muito magra mas de formas perfeitas, com uns longos cabelos alaranjados e muito ondulados que balançavam enquanto ela se deslocava. Apostava que teria uns olhos esverdeados ou, quanto muito, daquele tom muito claro de castanho que, às vezes, se assemelhava a amarelo mostarda, dando-lhe um ar ainda mais exótico. Ela viria, com certeza, vestida com um par de jeans justo, com a cintura descaída, deixando avistar o movimento do umbigo a cada passo que dava. A camisa, muito colorida, curta mas bastante larga, deixava que as suas formas apenas se imaginassem, tornando-a ainda mais sensual.
O toque estridente que anunciava o início da prova trouxe-o novamente à realidade. Acabou rapidamente de preencher o cabeçalho, conferindo o código da disciplina pelo quadro e aguardou que chegasse a sua vez de receber o enunciado. Pensou, triste, que agora a Cília tinha apenas quinze minutos para chegar. A sua vida nunca mais seria a mesma se ela não chegasse a horas. Não tinha sequer pensado nessa hipótese, nem queria imaginar o que seria viver mais um dia sem conhecer a sua deusa. Olhou distraído para o enunciado, viu as suas colegas iniciarem a leitura dos textos e pensou que era melhor começar a ler também. Pelo canto do olho via a cadeira vazia da Cília. Levantou a cabeça, verificou o relógio e olhou novamente para a porta, desejando ouvir os seus passos apressados no corredor.
"Nada! Ela não chegava. O que seria que lhe tinha acontecido?", pensava de si para si. Virou a página do enunciado sem verificar quais as advertências que lá eram realçadas e leu: Grupo 1, A, o resto desfocou-se, parecia que as letras tinham ganho vida própria, iniciando uma dança ritmada que apenas lhe avivava na memória a lembrança dos cabelos ondulantes de Cília. Não conseguia deixar de pensar na Cília e em como ela traria finalmente a tão desejada mudança para a sua vida. Via-se a dirigir-se a ela no final do exame, perguntando-lhe se este lhe tinha corrido bem. Trocariam então respostas, entre sorrisos embaraçados, com os olhos cada vez mais brilhantes e, sem darem conta de como tinham feito o percurso até lá, encontrar-se-iam sentados nos muros das velhas docas, a observarem a calmaria azul do rio no meio dos imensos reflexos coloridos de todos aqueles barcos de pesca. Custódio quase que conseguia sentir o toque casual das suas mãos, que imaginava trocarem. Depois, olhariam um para o outro, certos de que o amor à primeira vista existia e fariam planos para passarem juntos os meses de férias que cada vez se avizinhavam mais próximos.
Custódio voltou à realidade quando as professoras vieram conferir o cabeçalho da sua prova pelo documento de identificação que estava em cima da mesa. Pegou na caneta, usando-a para apontar o excerto dos Lusíadas apresentado, mas com o pensamento a fugir-lhe pelo canto do olho para a cadeira que teimava em se manter vazia, sem a sua Cília. Não conseguiu passar da terceira estrofe sem levantar novamente a cabeça para observar, uma outra vez, a porta. Olhou novamente para o relógio e, com os olhos marejados em lágrimas, pensou: "Agora é que foi, ela já não vem, a professora acabou de entregar a folha das faltas para o secretariado. Nada corre bem comigo, não vou conseguir fazer o exame sem sentir o apoio da Cília. Apetecia-me morrer...."
Leu mais uns versos, aleatoriamente e parou na palavra "Destarte". Lembrou-se da sua professora de Língua Portuguesa, que lhe dera aulas até ao nono ano e que insistia em utilizá-la sempre que escrevia no quadro. Pensava sempre que ela devia ser muito velha, apesar do aspecto jovem e muito elegante em que sempre se apresentava. Destarte era uma palavra velha. Velha e feia, em desuso e muito pouco conhecida. O seu som também não era nada agradável. Lembrava-se da sua mãe que dizia qua as palavras com iis eram mais melódicas do que aquelas sem iis. Essa fora uma das razões porque o seu nome era Custódio. O pai teria preferido André ou João mas a mãe insistira de que o filho teria que ter um i no nome para conseguir levar uma vida cheia de amor e de felicidade.
Engano, puro engano. O i no nome nada mais lhe trouxe senão risos e gozos entre dentes de colegas chamados Andrés, Joões e Manuéis. Custódio, só conheciam dos avós ou daqueles tios muito velhinhos, que às vezes vinham à cidade, vindos das suas casas escondidas entre hortas com couves a grelar a um metro de altura que nunca deixavam ver a porta."
....e continua na próxima vigilância.
Lembrava-se perfeitamente de que havia uma Carlota, três Carolinas, sete Catarinas e uma Cheila, antes do tão desejado nome da rapariga que ansiava conhecer. Cília, o Custódio nunca antes tinha conhecido uma Cília. Imaginava-a alta, muito magra mas de formas perfeitas, com uns longos cabelos alaranjados e muito ondulados que balançavam enquanto ela se deslocava. Apostava que teria uns olhos esverdeados ou, quanto muito, daquele tom muito claro de castanho que, às vezes, se assemelhava a amarelo mostarda, dando-lhe um ar ainda mais exótico. Ela viria, com certeza, vestida com um par de jeans justo, com a cintura descaída, deixando avistar o movimento do umbigo a cada passo que dava. A camisa, muito colorida, curta mas bastante larga, deixava que as suas formas apenas se imaginassem, tornando-a ainda mais sensual.
O toque estridente que anunciava o início da prova trouxe-o novamente à realidade. Acabou rapidamente de preencher o cabeçalho, conferindo o código da disciplina pelo quadro e aguardou que chegasse a sua vez de receber o enunciado. Pensou, triste, que agora a Cília tinha apenas quinze minutos para chegar. A sua vida nunca mais seria a mesma se ela não chegasse a horas. Não tinha sequer pensado nessa hipótese, nem queria imaginar o que seria viver mais um dia sem conhecer a sua deusa. Olhou distraído para o enunciado, viu as suas colegas iniciarem a leitura dos textos e pensou que era melhor começar a ler também. Pelo canto do olho via a cadeira vazia da Cília. Levantou a cabeça, verificou o relógio e olhou novamente para a porta, desejando ouvir os seus passos apressados no corredor.
"Nada! Ela não chegava. O que seria que lhe tinha acontecido?", pensava de si para si. Virou a página do enunciado sem verificar quais as advertências que lá eram realçadas e leu: Grupo 1, A, o resto desfocou-se, parecia que as letras tinham ganho vida própria, iniciando uma dança ritmada que apenas lhe avivava na memória a lembrança dos cabelos ondulantes de Cília. Não conseguia deixar de pensar na Cília e em como ela traria finalmente a tão desejada mudança para a sua vida. Via-se a dirigir-se a ela no final do exame, perguntando-lhe se este lhe tinha corrido bem. Trocariam então respostas, entre sorrisos embaraçados, com os olhos cada vez mais brilhantes e, sem darem conta de como tinham feito o percurso até lá, encontrar-se-iam sentados nos muros das velhas docas, a observarem a calmaria azul do rio no meio dos imensos reflexos coloridos de todos aqueles barcos de pesca. Custódio quase que conseguia sentir o toque casual das suas mãos, que imaginava trocarem. Depois, olhariam um para o outro, certos de que o amor à primeira vista existia e fariam planos para passarem juntos os meses de férias que cada vez se avizinhavam mais próximos.
Custódio voltou à realidade quando as professoras vieram conferir o cabeçalho da sua prova pelo documento de identificação que estava em cima da mesa. Pegou na caneta, usando-a para apontar o excerto dos Lusíadas apresentado, mas com o pensamento a fugir-lhe pelo canto do olho para a cadeira que teimava em se manter vazia, sem a sua Cília. Não conseguiu passar da terceira estrofe sem levantar novamente a cabeça para observar, uma outra vez, a porta. Olhou novamente para o relógio e, com os olhos marejados em lágrimas, pensou: "Agora é que foi, ela já não vem, a professora acabou de entregar a folha das faltas para o secretariado. Nada corre bem comigo, não vou conseguir fazer o exame sem sentir o apoio da Cília. Apetecia-me morrer...."
Leu mais uns versos, aleatoriamente e parou na palavra "Destarte". Lembrou-se da sua professora de Língua Portuguesa, que lhe dera aulas até ao nono ano e que insistia em utilizá-la sempre que escrevia no quadro. Pensava sempre que ela devia ser muito velha, apesar do aspecto jovem e muito elegante em que sempre se apresentava. Destarte era uma palavra velha. Velha e feia, em desuso e muito pouco conhecida. O seu som também não era nada agradável. Lembrava-se da sua mãe que dizia qua as palavras com iis eram mais melódicas do que aquelas sem iis. Essa fora uma das razões porque o seu nome era Custódio. O pai teria preferido André ou João mas a mãe insistira de que o filho teria que ter um i no nome para conseguir levar uma vida cheia de amor e de felicidade.
Engano, puro engano. O i no nome nada mais lhe trouxe senão risos e gozos entre dentes de colegas chamados Andrés, Joões e Manuéis. Custódio, só conheciam dos avós ou daqueles tios muito velhinhos, que às vezes vinham à cidade, vindos das suas casas escondidas entre hortas com couves a grelar a um metro de altura que nunca deixavam ver a porta."
....e continua na próxima vigilância.
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